quinta-feira, 9 de julho de 2009

Numa aula de história

Entrei na sala para minha aula de história. Coloquei o material sobre a mesa e com ele uma revista Super Interessante que trazia uma reportagem especial sobre o nazismo. Eu a havia apanhado para preparar algumas aulas sobre a Segunda Guerra.

Logo a minha frente, na primeira carteira da fila sentava-se o João Antonio que ao ver a revista interessou-se imediatamente e perguntou se poderia ler a reportagem. Eu cedi de pronto pois, não era comum naquele aluno o interesse pela leitura. Comecei, então, a distribuir um exercício com a turma. Enquanto isso, quase em êxtase, o João devorava o texto da reportagem. Fiquei admirado com aquilo e passei a observar a cena em silêncio. Os olhos do garoto brilhavam enquanto liam avidamente a matéria.

Aproximei-me e perguntei – porque você se interessou tanto por essa reportagem? – Porque gosto do Hitler, foi a resposta. Por que você gosta dele? –Porque acho um cara legal. –Você sabe que ele autorizou a morte de milhões de pessoas inocentes inclusive crianças, idosos e, até, deficientes físicos? –É sei. Mas, é por isso que eu gosto dele porque eu também não gosto de judeu. O que você sabe sobre os judeus? Nesse ponto o aluno desconversou e eu mudei a direção das perguntas: -Imagine que algumas daquelas pessoas fossem seus parentes, pai, mãe, irmãos.... O aluno respondeu com um frio dar de ombros. –E se fosse você o alvo das ações de Hitler? O menino não se alterou repetindo o mesmo gesto de indiferença.

Perturbado com a frieza e apatia com que o menino reagia a meus questionamentos fiquei a pensar que fatores poderiam levar uma criança de doze anos a adotar Hitler como seu ídolo? E mais, a admirá-lo exatamente pelas maldades que propagou. Surpreso com aquela conversa questionei-me e cobrei de mim mesmo uma atitude afinal tratava-se de meu aluno. Talvez aconselhá-lo, tentar desestimular aquela admiração sinistra. No entanto, sei que palavras exortativas não têm tanta eficácia quanto se imagina e se espera. A esperança pode estar além das palavras.

Creio que o João necessita de experiências humanas radicalmente positivas que ofusquem em seu horizonte existencial o espectro dessa figura e todo o mal que ela representou para o mundo contemporâneo. Além disso, há que se verificar o fundo psicológico de tal atitude.

2 comentários:

  1. Sugiro eletrochoque... Sinceramente, esse esquerditismo socialístico (para lembrarmos Odorico Paraguaçu) nos faz pensar em todo mundo como vítima: da sociedade, da família, dos problemas sócio-econômicos. Só que essas "vítimas" costumam vitimizar outros que também enfrentam tudo isso e superam. Aí eles são tidos como vítimas da genética, da personalidade... Temos que levar em conta que alguns seres são perversos. Em sua natureza. Não se enxergam maus pq é natural pra eles.
    Não estou dizendo que é o caso dessa criança, que eu nem conheço, mas que nem sempre palavras e exemplos alcançarão os objetivos. Temos que nos preparar, entre todas as possibilidades, que nos confrontaremos com seres amorais por natureza. Sem a menor capacidade de distinguir certo e errado, bem e mal. E quem idolatra Hitler é um forte candidato.

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  2. rs

    "Eletrochoque" seria muito hitleriano para um anti-nazista, não? rs

    Acho sinceramente que se eu pudesse aplicar o choque elétrico, faria. Por isso mesmo acho que ninguém pode ter esse poder...

    Concordo que falta gente na vida de uma criatura dessas.

    Mas o que quero mesmo dizer é que isso é muitíssimo mais comum do que eu pudia imaginar: só eu tive dois colegas de turma (turmas defetentes) que agiam de modo semelhante. Depois, anos depois, descobri que até se constrangem destas memórias... não sei se é estético (politicamente correto) ou se houve de fato uma reflexão sobre o absurdo. Só sei que, de algum modo, a grande maioria rejeita Hitler pela endemonização que a invasão cultural estadunidense dolosamente causou. E isso é péssimo. Porque bastaria outra invasão cultural pra...

    Falta mesmo (e a educação da "promoção automática" alimenta isto) é reflexão como política educacional inarredável. Coisa simples como a que você fez: "e se fosse você?".

    Isto me fez lembrar o episódio histórico do assassinato do estudante Edson Luis, durante o Regime Militar, quando puseram a seguinte indagação como slogan: "Assassinaram um estudante. Poderia ser seu filho". Não vejo mais slogans assim... vejo análises que já começam com adjetivos e, assim, evitam desgaste cerebral.

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