Ele era visto com a
regularidade larga e prudente com a qual os pais visitam seus filhos adultos. Ao
volante um senhor esguio com uma calva ampla e reluzente e seus óculos de
lentes grossas – daquelas que deixam os olhos pequenininhos e com um leve tom
de alheamento. Um bigodinho grisalho lhe
enfeitava a face simpática e generosa de vovô.
O velho escorte verde
que dirigia ficava estacionado, geralmente, na vaga externa do apartamento 27-B,
onde residia D. Ogla, uma senhora de meia idade, aposentada talvez, cujo rosto
conserva traços de uma beleza loira já um tanto usurpada pelo tempo. Não tinha
marido. Com ela morava um filho adulto, pai do Felipe, um garotinho esperto de
uns dez anos, de olhos curiosos que denunciavam aquela fase da existência em
que a vida se apresenta como um divertido parque de diversões.
D. Ogla era vista sempre
num ir e vir ativo, sempre acompanhada pelo neto. Levava-o à escola pela manhã
retornando para buscá-lo ao meio dia, além dos dias em que ele tinha aulas de
natação à tarde. Considerando as obrigatórias visitas semanais ao supermercado,
e as azedas críticas que fazia ao síndico em função de problemas que
eventualmente surgiam no prédio, D. Ogla levava a vida no ritmo comum da
maioria das donas-de-casa num centro urbano.
Mas, sem que nada
aparente acontecesse rotina das visitas
paternas quebrou-se. Um dia o corcel verde apareceu estacionado na vaga coberta
e não fora trazido pelo velho condutor. Algo incomum acontecera. Os dias foram
passando e o velho escorte continuou lá. Eventualmente, o filho de D. Ogla
aparecia e funcionava o motor do veículo. Às vezes dava uma volta pelo
quarteirão. Provavelmente para evitar que a bateria descarregasse ou coisa que
o valha. Porém, tal prática deixou de ser realizada há muito tempo.
Por esse tempo o carro
de D. Ogla passou a ser estacionado na vaga externa e a presença dela no prédio
foi se tornando escassa. Seu ir e vir já não era tão intenso e seu carro quase
nunca era visto no estacionamento. A infantil algazarra que o Felipe provocava,
ora com seus barulhentos passeios de skate pelo estacionamento, ora com o
futebol praticado com o pai, foi desaparecendo, até o completo silêncio. O
velho nunca mais foi visto. O escorte verde continua na vaga do 27-B. Uma fina
camada de pó o envolveu como um véu mortuário evocando uma súbita e melancólica
ausência.
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